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Setembro Amarelo e a importância da saúde mental dos profissionais

Categoria: Acadêmicos, Campanhas CFMV, CFMV, médicos veterinários, Notícias, zootecnistas | Publicado em: 14/09/2020

Desde 2015, o mês de setembro marca, no Brasil, uma série de ações voltadas à manutenção e melhora da saúde mental dos cidadãos, especialmente as voltadas à prevenção ao suicídio. Trata-se do Setembro Amarelo, criado numa iniciativa conjunta do Centro de Valorização da Vida (CVV), Conselho Federal de Medicina (CFM) e da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP).

Neste ano, os desdobramentos da pandemia da covid-19 potencializam os fatores de risco relacionados à saúde mental, tanto dos profissionais da saúde que estão na linha de frente quanto da população em geral, mais vulnerável por questões relacionadas ao isolamento e distanciamento social. Transtornos psiquiátricos como ansiedade, depressão e sintomas de estresse pós-traumático são potencializados em tempos de pandemia.

A saúde mental de médicos-veterinários

Para médicos-veterinários, saúde mental deve ser tratada com seriedade. Segundo o médico-veterinário Rodrigo Rabelo, de acordo com dados do Sistema Único de Saúde (SUS), esta é a classe profissional com maior risco de suicídio no Brasil (os dados do Datasus – portal de dados do SUS – de 1980 a 2007, indicam que, frente à população geral, a taxa de suicídio de médicos-veterinários é de 10,6 para um).

As principais causas que afetam a saúde mental dos profissionais, segundo Rabelo, são a síndrome de burnout e a fadiga por compaixão. A primeira compreende o esgotamento emocional crônico por sobrecarga de trabalho; já a fadiga por compaixão é a exaustão emocional de trabalho em prol do outro.

“Invariavelmente, a questão da eutanásia em animais e a frequência em lidar com a morte dos pacientes seja mais comum nesta especialidade do que em outras profissões. Infelizmente, é uma relação que afeta muitos profissionais de saúde e, embora seja uma questão problemática, os profissionais precisam estar preparados desde a formação na graduação para amenizar os impactos psíquicos”, explica Rabelo.

A médica psiquiatra Fernanda Benquerer Costa adiciona algumas ameaças à saúde mental de médicos-veterinários. “Alguns fatores de risco são: a existência de transtornos mentais, como a depressão, o uso de álcool e outras substâncias, o acesso a métodos potencialmente perigosos e algumas questões específicas da prática profissional, como a síndrome de burnout. Muitos profissionais vivenciam uma sobrecarga de trabalho em condições com pouco suporte organizacional”, avalia.

A psicóloga Joelma Ruiz, especialista em luto, avalia ainda que a Medicina Veterinária oferece uma experiência única nos cuidados aos animais, mas também exposição constante a situações de crise. Um exemplo seriam as histórias dramáticas narradas pelos clientes, sobre as quais não têm tempo para refletir como elas afetam e influenciam suas rotinas pessoais e profissionais.

“A equipe envolvida no cuidado lida com a pressão social de não estar autorizada a vivenciar as perdas de pacientes. O processo de luto do profissional de saúde ainda não é reconhecido e existem poucas oportunidades de expressão pública para facilitar a elaboração do luto, mas ele vivencia sentimentos de pesar diante do rompimento de um vínculo significativo com o paciente (expectativa de cura)”, avalia Ruiz.

Pandemia da covid-19 criou pressão profissional extra

Devido à pandemia, surgiu para os profissionais uma oferta enorme de palestras, grupos de estudo, lives, cursos on-line e trabalho remoto. Essas situações podem afetar a produtividade, gerando desgastes e problemas relacionados à saúde mental de quem atua nas áreas de ensino, palestras e consultoria, gerando, segundo Rabelo, um novo tipo de esgotamento físico-profissional.

Rabelo destaca, contudo, que a questão do trabalho na modalidade remota afetou poucos profissionais da lida operacional: “Os médicos-veterinários que estão em consulta, fazem procedimentos e cirurgias não tiveram grandes alterações nas suas rotinas. Os plantonistas, os mais suscetíveis ao burnout dentre toda a linha de profissionais, e médicos-veterinários que fazem plantão na internação não foram para o home office.” Ele conclui que, para esses profissionais, foi acrescentada à rotina quase uma obrigação de se atualizar pelos meios digitais.

“Neste momento, há a sensação de que todo mundo precisa aprender várias habilidades novas na pandemia, como se fossem férias ou tempo extra, e não percebem que continuam trabalhando muito mais do que antes e deveriam buscar um suporte para balancear os impactos decorrentes desses fatores”, pontua.

A psiquiatra Fernanda afirma que já estão sendo realizados estudos sobre as consequências para a saúde mental das pessoas dessa primeira pandemia ocorrida na escala e com as condições em que vivemos atualmente, conectados ao mundo virtual.

“Há fadiga física e mental pelas longas horas em frente a um computador, as reuniões por vídeo demandam mais atenção do que as presenciais e existe risco de lesões osteomusculares, como tendinites, por exemplo. Outra questão é a perda de limites entre vida pessoal e profissional. Pessoas em teletrabalho desempenham suas funções por mais horas do que presencialmente, não há desconexão. As formas de controle usuais do trabalho presencial precisaram se adequar”, ressalta a psiquiatra.

Fernanda adiciona, ainda, questões emocionais geradas pelo distanciamento social. O estresse decorrente do impacto econômico advindo da crise, por desemprego e subemprego, entre outras perdas, também tende a se intensificar. “Perdemos ou reduzimos o contato com amigos e parentes, deixamos de frequentar locais públicos e o suporte social se reduziu, fatores que agiram sobre a saúde mental”.

Autocuidado

Cada indivíduo enfrenta as questões relacionadas à saúde mental de uma forma, segundo a psiquiatra. Alguns indivíduos, no entanto, merecem mais atenção.

Alguns grupos de pessoas têm mais risco de adoecer psiquicamente, como quem já apresentava transtornos mentais, profissionais envolvidos diretamente no atendimento a pessoas com covid-19 e o chamado grupo de risco, pelo estigma associado e restrições mais intensas. Inclui-se também aqueles que tiveram perdas e os rituais de luto restritos. “Todos esses podem precisar de estratégias específicas de cuidado”, sinaliza Fernanda.
Como precaução, a busca pelo autocuidado é fundamental. Alguns exemplos são manter uma rotina de horários regulares, cuidar da alimentação, praticar atividade física, organizar espaços em casa, fazer pausas ao longo do dia de trabalho, buscar atividades prazerosas e atentar à qualidade do sono. A psiquiatra destaca também que é importante refletir sobre os próprios sentimentos e emoções, entender o que se sente.
As relações sociais são fonte de suporte e acolhimento, e é importante cultivá-las, mesmo que fisicamente distantes.
Vale ajudar pessoas que necessitem, por meio de ligações ou com alguma atividade diária, oferta de tempo e presença genuína. “Muitas pessoas têm sofrido com o isolamento imposto pela pandemia e precisam de apoio. Isso dá um sentido maior a tudo isso que vivenciamos e aumenta a sensação de bem-estar, além do senso de coesão social e pertencimento”, detalha Fernanda.
Para Rabelo, o ideal seria limitar plantões dos profissionais a 12 horas de trabalho, sendo o nível ideal entre seis e oito horas de jornada. “A substituição das atividades diárias também é uma alternativa para o profissional não permanecer na mesma função por mais de seis horas”, sugere.
Ele assinala, no entanto, que em plantões de clínica-hospitalar é mais difícil administrar esses limites. “Trocar o tipo de rotina dentro do próprio hospital, assumir a função de outro colega, ainda que por uma semana, gera resultados positivos”, observa.
Outras dicas do médico-veterinário são: organizar as tarefas diárias com uma agenda de compromissos, priorizar os momentos com a família, horários de lazer, ter hobbies, nada muito longo ou muito extenso, mas criar uma ideia de desvincular a atenção profissional para questões familiares, religiosas, exercícios físicos, qualquer tipo de distração que seja útil.
A psicóloga Joelma Ruiz saúde física e mental devem ser prioridade, incluindo na rotina a prática de atividades que tragam prazer. É essencial ter uma rede de apoio e procurar compartilhar os sentimentos com os colegas, amigos ou familiares, além de identificar as causas de estresse. “Embora não se possa eliminar o estresse, tal fator é passível de gerenciamento, com autoconsciência que pode ser desenvolvida diariamente, ambiente propício às relações interpessoais saudáveis e administração de eventos previsíveis”, orienta.
A psicóloga coordena o Espaço de Psicologia Joelma Ruiz, que se dedica ao apoio, suporte, orientação, educação e assistência psicológica às situações de perdas pessoais e profissionais. Nele, o grupo de apoio ‘Cuidando de quem cuida’ proporciona troca de experiências e compartilhamento do sofrimento, com encontros direcionados aos médicos-veterinários sendo realizados de modo on-line, uma vez por mês. “A identificação permite compreender que não estamos sozinhos, pois sentimentos e conflitos são expressos de forma coletiva”, explica.
Prevenção o ano todo

Rabelo destaca que a campanha Setembro Amarelo tem a importância de renovar os votos de preocupação com o tema e lembrar que é uma data importante no calendário. “A atenção às questões de saúde mental deve ser contínua ao longo do ano. A questão psíquica é tratada, anualmente, por meio da campanha Setembro Amarelo, mas é importante reforçar a conscientização com o cuidado psíquico sempre, para atingir resultados eficazes com a população”, afirma.

Os estudos e especialistas na área têm percebido, alerta Fernanda, que a campanha tomou uma dimensão distorcida ao que se pretendia. Para ela, é necessário repensar a forma como um assunto sensível, como o suicídio, é tratado. “Somos favoráveis a falar sobre prevenção, mas ao longo do ano todo, e que os discursos de acolhimento e empatia realmente se mostrem com atitudes adequadas e redução do estigma a respeito de quem passa por uma crise suicida. Outra preocupação é com o impacto das mensagens sobre os enlutados por suicídio, que podem aumentar neles o sentimento de culpa. Existem recomendações de órgãos oficiais a respeito de como lidar com o tema nas mídias, inclusive material específico voltado à comunicação em redes sociais”, explica a psiquiatra.

Para Fernanda, é inviável manter um engajamento ao longo de um mês inteiro, levando o tema, que até há alguns anos era tabu, a ser banalizado. “Existe uma preocupação de que esse tipo de campanha possa levar até um aumento do número de tentativas neste período e muitas mensagens inadequadas sendo veiculadas, sem uma melhor análise crítica sobre seu impacto”, avalia.

Falar sobre o tema

A sociedade precisa falar sobre o tema e acabar com o estigma das questões de saúde mental, pondera a psiquiatra. “Estar em sofrimento ou ter um transtorno mental não é sinal de fraqueza, não é escolha e não é motivo de vergonha. Os profissionais não são menos competentes por estar em tratamento”, sinaliza.

Por isso, reafirma Fernanda, é essencial que pessoas em crise busquem ajuda. “Existem vários caminhos possíveis e os melhores resultados vêm da combinação de várias ações. Existe o CVV, uma organização formada por voluntários treinados para oferecer uma escuta qualificada, por exemplo. E o tratamento especializado com psicólogos e psiquiatras é essencial nas intervenções em crise.”

Ela lembra que empresas podem fazer ações pela qualidade de vida de seus trabalhadores, oferecendo condições de trabalho adequadas, uma cultura organizacional que não tolere nenhuma violação de direitos ou assédio, a promoção de um ambiente respeitoso, que incentive a autonomia dos trabalhadores e permita o crescimento profissional. “Nenhuma ação isolada é suficiente, e a prevenção deve se dar ao longo de todo o ano, não só com discursos, mas com ações e atitudes”, orienta.

Para Joelma, vale conversar com familiares e amigos que a depressão pode afetar pessoas de qualquer idade ou profissão, em qualquer etapa da vida. “É o primeiro passo para quebrar o tabu e entender melhor o assunto, reduzindo o estigma para que cada vez mais pessoas procurem ajuda. Informação é o melhor remédio”, afirma.

Onde procurar ajuda

A Rede Pública de Saúde conta com uma Rede de Atenção Psicossocial que atende a toda a população e é organizada em níveis de atenção. Os serviços disponíveis, bem como perfis de atendimento e contato estão disponíveis em www.saude.df.gov.br/saude-mental.

Para saber mais sobre o assunto:

Site oficial do Setembro Amarelo
Site do Centro de Valorização da Vida
Cartilha completa da Associação Brasileira de Psiquiatria (ABP) e do CFM

Fontes:

Fernanda Benquerer Costa, médica-psiquiatra, referência técnica distrital em Psiquiatria da Secretaria de Estado da Saúde do Distrito Federal;

Joelma Ruiz, psicóloga especialista em luto;

Rodrigo Cardoso Rabelo, médico-veterinário, gerente no Departamento de Pacientes Graves do Intensivet Núcleo de Medicina Veterinária Avançada (DF)

Assessoria de Comunicação do CFMV


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